
Coco | s. m. | adj.
s. m., Bot.,
fruto do coqueiro;
Para um rapaz de dez ou onze anos, ir ao cinema significa normalmente ir ver algo que o vai divertir durante umas horas. Usualmente serão filmes de animação ou comédias, alguns filmes de acção sem excessos, e filmes fantásticos (A Guerra das Estrelas p.e.).
Numa bela quarta-feira à tarde nos idos de setenta, vi um filme que veio marcar a minha forma de ver e sentir o humor. O título parecia ser interessante e as imagens nos cartazes eram apelativas: tratava-se de uma história passada na idade média com cavaleiros de armadura e espada, castelos, donzelas e batalhas e isso tudo. Embora naquela altura às quartas-feiras houvesse sempre sessão de cinema no velho teatro D.Luís Filipe, nem sempre os títulos eram grande espingarda. Às vezes acontecia, o que a malta costumava dizer, uma ‘banhada’! Um dos que me vem à memória foi “Mon oncle d’Amérique”. Manifestamente ou não tinha idade para o ver na altura que vi, ou a nouvelle vague francesa não faz o meu género.
De regresso aos nossos cavaleiros. As imagens iniciais do filme perdem-se já nas brumas da memória, mas há uma que fica para sempre: quando saídos detrás de uns arbustos na floresta a trote dos seus ‘cavalos’, vemos um grupo de cavaleiros vestidos a rigor mas... sem cavalos! Hélas, o som do trote era nem mais nem menos do que duas metades de um coco que eles faziam soar uma na outra num movimento de braços e mãos que acompanhava o ritmo da ‘cavalgada’ das pernas. Mas que diabo era aquilo!!!
O filme entretanto decorreu normalmente. Tão normalmente quanto se pode chamar de normal uma histórias de cavaleiros com cocos em vez de cavalos, monstros em forma de coelho, andorinhas de várias latitudes e last but not the least a prisão de toda a gente pela polícia pelo homícido de alguém que verdadeiramente nem entendi que fazia ali no filme. E com as sirenes da polícia a interromperem uma batalha campal crucial!... E depois o filme acaba. Assim sem mais. Parecia que a bobine tinha partido. Nem fim, nem the end, nem genérico. Nada. Niente. Ziltsch. A malta toda ficou a olhar para o projectista, que entretando já tinha acendido as luzes do teatro para que não houvessem dúvidas que o filme tinha acabado. Ele limitou-se a encolher os ombros e a rir. Bem, parecia que tínhamos sido vítimas de alguém com um sentido de humor algo bizarro... E logo a meio da batalha! Onde é que agora ia ver o resto do filme!?
Toda a gente saiu comentado: “Que banhada, meu. F***-se!!!” “Podes crer!” “E a cena dos cocos!?” “Hiiii, meu nem me fales!”. E assim se passaram umas horas. E uns dias. E umas semanas. E não parámos de comentar o filme nos seus múltiplos ângulos, nas suas múltiplas formas, cenas, gags, eu sei lá! Ele era a cena do cavaleiro negro, ele era a cena do coelho monstro, ele era a cena das andorinhas do abismo (e das resposta erradas). Todo o filme foi dissecado nas semanas que se seguiram à sua exibição e aquilo que inicialmente tinha sido entendido como uma ‘banhada’ começava a transformar-se em algo estranhamente diferente. Afinal aquilo era humor!? Era assim o humor inglês? Ná. Não podia ser. Aquilo era diferente. Muito diferente. Que impacto! E logo aos 10 anos...
Tínhamos acabado de ver apenas um filme dos Monthy Python. Essa obra-prima do humor que dá pelo nome de “O Cálice Sagrado”.
Depois a história continuou. Lá vieram “A Vida de Brian”, “O Sentido da Vida” e a suprema série de TV “Monthy Python Flying Circus” (a ordem é minha).
E a minha forma de olhar e interpretar o que se passava à minha volta, passou a ser diferente. Um pouco mais... humorada?








